Pergunta:

Olá Su! Por vezes a minha indignação com o mundo machuca a mim mesma e me leva a vários e longos pensamentos, principalmente os hipotéticos cheios de “eu deveria” e “e se eu tivesse feito isso ou aquilo” ou apenas imaginando uma coragem agressiva que nunca terei, porque seria maldosa. Hoje aconteceu um preconceito racial na sala de aula por meio de uma piadinha, o professor, que é negro foi a quem a piada se dirigiu explicitamente e a respeito da qual ele riu. É absurdo! Eu sou negra também e não achei engraçado. Sério, minha pele não é cor de bosta. E foi basicamente isso o que foi dito. Se o próprio professor que é negro riu e em sequência a sala inteira, como vou levantar minha voz e dizer que aquilo foi idiota, ainda mais vindo de um menino considerado tão esclarecido por todos e admirado até por mim (falo no sentido de ALGUMAS linhas de pensamento dele)? As palavras que ele usou não foram essas, mas não muda a que se referiu. É tão ridículo! As pessoas sabem o que é preconceito e não mudam, elas acham que está tudo bem com algumas brincadeiras. E tipo, era um menino branco falando. O que ele sabe afinal? Quão grave ele entende que isso é? Eu me senti tão pequena aquela hora. Se eu falasse qualquer coisa séria seria uma menina chata, afinal, o próprio professor que é mais escuro do que eu riu. Puxa…o que eu deveria ter feito? E as vezes que o professor faz piadas com o tom da própria pele? Dependendo do que é, se fosse só entre negros eu não me importaria, mas… não é. Não estou falando que está certo, estou falando que aquele povo não entende nada e fica rindo. E tinha alunos negros rindo também, mas sabe quando a pessoa é clara o suficiente para se considerar morena e não negra? Tem tantas coisas bonitas para associar à cor da minha pele, porque escolher XX para isso? Quando eu tinha nove anos, a professora fez uma “piada” na sala. Se eu pudesse voltar no tempo não teria rido e ainda falaria que ela errou feio. Eu gosto dessa professora até hoje, mas isso não foi legal. Ela contou que o que explicava a palma das mãos dos negros serem claras é porque havia um rio. E os negros lavaram só as mãos. Quem é branco tomou banho de corpo inteiro. Ou seja: a cor da minha pele é sujeita? Eu sou suja? Eu não tomei banho direito? Então minha cor sai se eu limpar? Estou chorando. Estou com nojo e raiva do mundo. Do mundo que me desrespeita descaradamente. O que posso fazer se houver uma próxima vez? Eu sei que você é branca, então se eu te ofendi de algum jeito nesse texto, peço sinceras desculpas. D. P.s.: não sei se pareceu que eu vejo o mundo muito negro/branco, mas não é de propósito. Não sei outra forma de ver porque nunca é diferente disso.

Resposta da Sú:

Hello, D.! Sinto muitíssimo por mais essa experiência terrível de preconceito que você teve. Posso apenas imaginar como essa uma provação constante. Fiquei indignada por tabela e peço que Deus conforte seu coração.

Há algumas coisas práticas que você pode fazer sem partir para a hostilidade. Ainda dá tempo de você procurar a coordenação da sua escola e relatar esse episódio com o professor. Aliás, pode ser boa ideia você comentar, com muita calma e respeito, que esse professor abre espaço para brincadeiras preconceituosas com a postura que ele adota. Pelo jeito, ele é do tipo que pensa: “Vou fazer uma piada a respeito de mim mesmo antes que outra pessoa faça” – esse é um mecanismo de defesa comum, mas prejudicial, pois só reforça o problema. Diga para o coordenador, diretor, pedagogo, mediador (seja lá quem for que você tiver mais liberdade de conversar) que esse não é o primeiro caso e que você se sente muito mal e deseja que tomem alguma medida prática. A meu ver, é melhor você não esperar até que aconteça de novo. Quanto antes falar, melhor.

Você também pode conversar com seus pais e pedir que eles entrem em contato com a escola e reforcem o pedido para que alguém converse com esse professor. Também pode ser interessante falar com colegas seus e ver se alguém se dispõe a ir junto com você se queixar dessa situação. O que aconteceu é inaceitável. Agora que já passou um tempo e os ânimos talvez tenha esfriado um pouco, é o melhor momento para abordar essa questão com alguém da escola que possa intervir.

Como cristãos, precisamos ter uma política de “tolerância zero” em relação a injustiças e preconceitos (nossos e de outros). Isso não significa sair metendo a boca em todo mundo, desrespeitando professor na frente da classe, etc. Mas com certeza significa levantar a questão com a direção/coordenação da escola, liderança da igreja, ou seja o que for, de modo sereno e respeitoso. Esse é o  procedimento para episódios preconceituosos em instituições, como escola, empresa e igreja. Nos relacionamentos pessoais, se alguém fizer um comentário que lhe parecer preconceituoso, espere alguns dias e, então, com toda calma e bondade, explique para a pessoa que o comentário chateou você. Chame a atenção dela para o preconceito. Aliás, além das medidas que descrevi acima, você também pode fazer isso com o menino que gerou o comentário em sala de aula.

A mansidão que a Bíblia nos instrui a ter não é permissão para deixarmos a injustiça correr solta pelo mundo afora. Se você ler os Evangelhos com atenção, vai perceber que Jesus só se calou diante dos acusadores dele antes da crucificação porque não tinha mais nada a dizer. Antes disso, ao longo do ministério dele, ele disse coisas duríssimas para os líderes religiosos hipócritas e preconceituosos.

Peça para o Senhor lhe dar muita sabedoria, coragem, domínio  próprio e todos os outros elementos tão necessários do fruto do Espírito para lidar com cada uma dessas situações.

Ver o mundo em preto e branco pode não ser uma coisa ruim se você deixar que Deus use isso para promover conscientização e trazer um pouco mais de justiça dele para o mundo – com o poder dele e do jeito dele. Pense nisso.

E fique muuuuito sossegada, pois não me ofendi de maneira alguma. Pelo contrário, sinto-me envergonhada de pensar que alguém com a pele da mesma cor que a minha é capaz de tanta maldade. Graças a Deus porque em Cristo não há gênero, cor de pele, etnia, nível de instrução – nadinha.

Forças do Senhor para você, minha amiga!

Até a próxima!

 

Kisses,

Su