Hello,
D.! Primeiramente, feliz de saber que você tem feito bom uso dos recursos do
YouVersion (como você mencionou na outra mensagem) e que Deus tem lhe dado
crescimento. Os presentes dele para nós são sempre muito bons!
Começando a responder suas perguntas que, aliás, têm várias interligações e
sobreposições:
1 – Quem disse que você precisa ser sempre compreensiva e gentil? Tenho a impressão de que fomos ensinadas desde cedo (especialmente na igreja) que devemos ser quase angelicais, sem desejos próprios, sem conflitos interiores, exalando amabilidade e delicadeza, sem esperar nadinha em troca (mais sobre isso na pergunta 2). A meu ver, gastamos tempo demais tentando mostrar os comportamentos certos que, na verdade, deveriam ser transbordamentos de um relacionamento certo. Pense comigo. Temos duas instruções fundamentais que devem reger nossa vida (e a sequência delas é importantíssima!): Amar a Deus e amar ao próximo. Amar a Deus é aprender sobre ele, mergulhar em quem ele é, apreciar os inúmeros aspectos de seu caráter, passar tempo na companhia dele, pedir ajuda dele para ver as coisas com os olhos dele, ter a mente e o coração dele. Aprendemos a amar a Deus no meio das situações diárias, pois é em nosso cotidiano que ele se revela. Com a ajuda do Espírito, mantemos os olhos abertos para vê-lo em tudo ao redor – nas coisas da criação e nas ações dele. Nossos sentimentos, atitudes e condutas aos poucos começam a vir desse centro. Essa dinâmica não é linear, certinha, limpinha. É bagunçada, cheia de altos e baixos, de misturas de sentimentos e desejos que só Deus consegue entender. Somos pessoas inteiramente novas em Cristo, mas ainda lidamos com resquícios de nossa natureza anterior. E não tem nada de errado em reconhecermos isso. Aliás, outra forma de amar a Deus é acolher tudo o que somos e apresentar essa mixórdia toda para ele 🙂
O caminho, portanto, não é tentar reprimir os sentimentos quando ficamos magoadas com coisas que talvez pareçam pequenas para outros. Não adianta repetirmos para nós mesmas: “Ah, deixa pra lá!”. Isso só traz mais frustração, pois não temos condições de mudar nossos sentimentos por imposição. O caminho é acolher esse aspecto de nossa personalidade, aceitar que somos sensíveis, que nos chateamos com X, Y e Z, não importa o que outros pensem. E, então, levamos essa chateação para Deus e perguntamos o que fazer com ela. Algumas vezes, Deus nos mostra por que algo nos magoou, mostra o que está por trás de nossas expectativas frustradas e nos ajuda a avaliar se são legítimas ou se precisam ser ajustadas por ele. Expectativas legítimas e saudáveis com frequência apontam para questões que precisam ser conversadas com outros (mais uma vez, entramos no tema da pergunta 2).
E, quanto mais nos aprofundamos no amor de Deus, mais passamos a agir como resultado da certeza de que somos amadas, e não apenas como obrigação de ter bom comportamento (ser compreensivas, gentis, abnegadas). Claro que às vezes precisamos fazer coisas que não temos vontade, pois sabemos que é o certo. Mas, quando fazemos isso dentro do contexto do amor de Deus por nós (e vice-versa), não mantemos um registro desses “sacrifícios” e, portanto, não nos sentimos tão tentadas a cobrar isso de outros depois. Lembrando sempre que essa dinâmica toda não funciona como uma chave de “liga/deliga”. É um processo que se estende ao longo de toda a vida. Tem dias que vamos ser menos compreensivas, menos agradáveis para os outros ao redor, menos pacientes, mais carentes e exigentes. E tudo bem – desde que levemos tudo o que pensamos e sentimos para Deus com honestidade, sem tentar produzir o fruto do Espírito com esforço próprio. Haverá momentos em que precisaremos expressar para outros nossa insatisfação e nossas necessidades. Haverá momentos em que será melhor nos calar. Haverá momentos em que teremos de pedir perdão porque explodimos e jogamos na cara de outros o “registro de bondades” que guardamos em um canto da mente. Nada disso está nos separa do amor de Deus, e o amor dele por nós é ativo e produz mudança. Ele começou a “boa obra” em nós e ele “vai completá-la até o dia de Cristo Jesus” (Fp 1.6). Nosso trabalho é acolher o estado em que nos encontramos hoje, pois, mesmo que ele não corresponda aos padrões de beleza interior e bondade que idealizamos, é o estado em que Deus nos colocou neste momento. Onde a gente vê caos, feiura e inadequação, ele vê a belíssima obra que, dentro de seu conhecimento perfeito e eterno, ele já completou 🙂
2 – Essa é uma pergunta que eu sempre faço também, e acho que não tem uma resposta simples. Deus nos criou para relacionamentos de reciprocidade. Quando dizemos que relacionamentos saudáveis precisam ser recíprocos, isso automaticamente implica expectativas. É legítimo esperar afeto, aceitação, interesse, apoio e cuidado de nossos pais, de amigos chegados, de nosso parceiro/namorado/cônjuge. Quanto maior o nível de intimidade e compromisso, maiores as expectativas. E é realista e saudável esperar, também, que nem sempre outros serão capazes de oferecer tudo o que precisamos ou desejamos. A meu ver, nos relacionamentos mais próximos, fazemos bem em dizer para a outra pessoa quando não estamos nos sentindo aceitas, ou quando gostaríamos que demonstrassem mais de interesse por algo importante para nós. É injusto esperar que outros preencham algumas expectativas que nós nunca expressamos. Por vezes, a pessoa imagina que está demonstrando afeto, mas não o faz de uma forma que entendemos. Nesse sentido, o livro “As cinco linguagens do amor” tem algumas ideias muito úteis, que valem não só para o casamento, mas para todos os relacionamentos (https://www.amazon.com.br/dp/B00E9CD9L2/ref=dp-kindle-redirect?_encoding=UTF8&btkr=1)
A contrapartida disso é ter disposição de ouvir o outro e expressar afeto, interesse e cuidado de maneiras que ele entenda. Isso é reciprocidade. Em um relacionamento recíproco, temos consciência de nossas necessidades e expectativas legítimas, mas também ficamos atentos para as necessidades e expectativas legítimas do outro. Quando falta reciprocidade de qualquer uma das partes, entramos no território das interações egoístas, narcisistas, interesseiras, que podem ter várias gradações. Em alguma medida, todos nós seremos interesseiros e egoístas em algum momento. Mas existe uma diferença entre ocorrências pontuais, e um desequilíbrio persistente dentro do relacionamento.
E o que fazer quando procuramos amar a outra pessoa e nos interessar por ela, mas não há reciprocidade? Em todos os relacionamentos, temos de usar o diálogo e nos comunicar do modo mais claro e objetivo possível. Se ainda assim não houver mudanças, as medidas a serem tomadas dependerão do tipo de relacionamento. Não dá para esmiuçar cada um deles aqui, mas em alguns casos vale insistir e, em outros, é saudável se afastar. Qualquer que seja a situação, precisamos sempre voltar à fonte de tudo: nosso relacionamento com Deus. Em última análise, só ele supre todas as nossas necessidades. E, como conversamos muito tempo atrás, por vezes, ele muda nossas necessidades. Veja uma pequena reflexão sobre isso aqui:
Okay,
essas são as respostas para hoje. As outras ficarão para depois, em doses
homeopáticas 🙂
Que o Senhor nos aprofunde cada vez mais no amor dele e na dedicação a ele, pois
esse é o “princípio da sabedoria” (Pv 9.10) para lidar com todas as nossas perplexidades.
Bom fim de semana e até breve!
Kisses,
Su